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quarta-feira, 12 de março de 2008

As duas Palmeiras

Na frente da sorveteria que eu trabalho há duas palmeiras. Uma rente ao muro, num canto. Outra mais ao centro do terreno, onde as pessoas passam por ambos os lados. Quando fomos plantar as palmeiras, minha irmã advertiu que não podia plantar palmeiras em pares. Superstição ou estudos à parte plantamos um par delas.Como sempre, o encarregado de regá-las era eu. Raramente o fazia. Se quisessem água esperassem por chuva, ora. Numa selva elas não vão ter água trazida num balde. Elas também têm que aprenderem a se virarem sozinhas. E nem deve ser tão difícil, nem flor elas fazem.Depois que eu comprei meu relógio, passei a marcar o horário de tudo. Cinco pra hora o ônibus passa em direção ao centro, hora e cinco do centro à BR. Três e meia passa um vendedor de quindim, eu sempre quis comer quindim, um dia chamei o vendedor, comprei. Foi o primeiro e ultimo quindim que provei. Trinta minutos depois passa uma senhora que vende suco na frente do mercado. Vinte pras seis começa a cruzar as estudantes de volta pra casa. Mas é por causa de uma loirinha que eu fico todos os dias na frente da sorveteria esse horário. É uma loirinha que não sei o nome nem onde mora nem onde estuda ou trabalha, mas ela passa num ônibus e me abana. Eu abano de volta.Ás seis horas aumenta o movimento de mulheres enfiadas em suas calças “knor” fazendo caminhada. E tem uma moreninha que não sei como ela consegue respirar naqueles shortinhos dela. Segundas, quartas e sextas-feiras são os dias da caminhada dela. Qualquer dia desses vou me encher de coragem e vou interromper sua caminhada, lhe tirar os fones de ouvido de seus ouvidos e... e ai na hora eu invento.Sete e meia, da tarde, é claro. É o horário que eu queria chegar. Todos os dias (fora domingo) às sete e meia, Elias saia da sorveteria e ao passar pela palmeira do centro passava-lhe a mão direita. Acho até que lhe falava alguma coisa. Sempre quis saber o que ele falava. Essa palmeira sempre foi mais desenvolvida que a do canto, esquecida, excluída, solitária. Acho que a palmeira do centro crescia era com o carinho despendido por Elias. Mas sempre fiquei na dúvida que de repente a outra não crescia por estarem dispostas em par, como alertava minha irmã.Algo me dizia que a primeira opção era a mais coerente. Alias não qualquer coisa. O que me dava sinal disso era a própria palmeira.Elias adoeceu e não pode mais ir trabalhar. Com a saúde cada vez mais debilitada ele teve de ir a Porto Alegre se submeter a alguns exames e provavelmente a alguma cirurgia.Sem a mão e as palavras de Elias, a palmeira parou de crescer, de criar novas folhas e foi murchando e as folhas que tinha foram secando.O que mostra que além do carinho de Elias, ela precisava da repetição deles para crescer. Precisava de sua mão diária e pontualmente às sete e meia. Assim é um time de futebol. Idêntico. Mais que planejamento, um clube necessita de continuidade, de repetição. Dificilmente um time que vive trocando de técnico e de escalação consegue se manter no topo por muito tempo, isso quando chega ao topo.


Elder Nunes Corrêa Junior

Texto Publicado no Cenário de Notícias em 4/março/2008

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