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segunda-feira, 31 de março de 2008

Coisas de Cabeça

Aposto que se dissessem que Sérgio fora o Rei do forró e campeão de cuspe em distância, onde morava, ninguém por aqui comentaria tanto. Mesmo admitindo que ele dança tanto quanto cospe( e ele cospe longe). Só que espelharam que o Sérgio era corno. Só corno não: O CORNO, assim era chamado. Com o “O” adjetivado.Provavelmente, foi um inimigo seu quem inventou esta história (se é que é mesmo invenção), mas bem que pode ter sido um amigo. Que os amigos também fazem dessas.Atualmente é moleza. A internet proporciona essas sacanagens. E gente pra fazer maldade (por mais verdade que seja, é sacanagem) não faltam.No início só o pessoal da turma fazia troça. Com o passar dos dias a história tomava formas e não adiantava o Sérgio desmenti-la ou tentar remendar. Em pouco tempo o colégio inteiro já sabia da sua cornice de outrora.Sergio, que sempre gostou de namorar sério, já não podia. Por dois motivos óbvios:Todos o chamariam de corno, mesmo que sua companheira fosse um exemplo de fidelidade.2. As mulheres ficavam com ele para trair.Um horror! Por isso ele só “ficava”. Mas nem isso fazia com que parassem de chamá-lo de corno.CORNO! CORNO! CORNO... Por onde andava ouvia caçoarem. Aquilo incomodava, claro que incomodava.Em casa, sozinho, ouvia o ringir da porta: Cooorrno; o fechar da geladeira: corno; um vizinho chamando outro: e aí seu corno; a buzina do carro: corrrno; o vendedor de laranja: óia o côôôôôôrrrrnoo; o grito da torcida ecoando no Beira Rio lotado: corno, corno, corno...Teve de se tratar num psicólogo, depois num psiquiatra.Porque inventaram isso ou quem o fez, não sei... mas que todos acreditaram, ah acreditaram. E isso atrapalhou muito sua vida aqui em São Gabriel. Assim é o Inter, com essa história de carrossel. Tomara que os jogadores colorados não acreditem. Do contrário é o torcedor quem vai enlouquecer ouvindo em cada ruído: GRÊMIO! GRÊMIO! GRÊMIO...

Elder Nunes Junior

Texto Publicado no Cenário de Notícias em 29/03/2008

terça-feira, 25 de março de 2008

O VALOR DA AMIZADE E DE UM GOL

Ary é mais que um goleiro, é um amigo que não foi o tempo nem a morte que me afastou dele. Foi minha culpa. Nossa amizade era tão verdadeira eu se um dia eu fizer um dicionário, colocarei a foto do nosso time onde estou o abraçando, ao lado. Esse ano já voltei ao campinho onde jogávamos umas três vezes, e lá fiquei relembrando da infância correndo sobre aquela grama rala. Minha lástima maior, a que fez encher meus olhos d’água é exatamente o fato que ocorreu comigo e o Ary naquele inverno de... tempos, muito tempo atrás. Ary era meu companheiro de ir ao laguinho ver as meninas dando comida às tartarugas e principalmente de jogar e conversar sobre futebol. Era o Ary que me ajudava a vender os santinhos que davam direito a quadros escolares. Como eu era tímido, ela saia comigo pra me ajudar a vender os meus também. Eu queria muito aquele quadro. Tanto que minha mãe disse que compraria os que faltassem, mas como faltavam muitos e eu estava ciente de nossas necessidades, disse pra ela que tinha vendido todos. Não conseguiria o tão desejado quadro. O Ary, vendo minha tristeza, pegou meu dinheiro e minha cartela dizendo que levaria lá pra mim. Ele trocou, disse que eu tinha vendido todos e ele não tinha conseguido. Bá, quando o diretor me chamou, credo... que felicidade! Olhei pro Ary, sabia que era coisa dele e o abracei agradecido. Aquilo é que era amigo. Ele sempre me convidava pro seu time, embora eu jogasse pouco. Mas no torneio do bairro o melhor time o convidou pra atacar e ele não conseguiu me colocar no time. Acabei jogando no “Excluídos”, um nome bastante sugestivo. Ary, mais que ninguém sabia como eu jogava. Sabia que eu não enfeitava, não usava calcanhar e quando eu preparava o chute era porque eu ia mesmo chutar. E mesmo assim toma gols meus. E ainda dizia: “que bucha heim”. Nesse torneio, o time deles estava invicto quando foi nos enfrentar; e nós não tínhamos vencido nenhuma, aliás, não tínhamos nem empatado. Como eu era o último reserva, pedi pra ele me deixar fazer um gol. Ele topou de pronto. Cinco minutos pro fim eu entrei. Fui tabelando em direção ao gol e quando estava de cara com o Ary, certo de que faria o gol, fiz que ia chutar, tipo o chute falso do Valdívia e passei por ele, que estava estirado feito um trapo velho no chão. Gol. Golaço. Era nosso melhor jogo. Provavelmente seria nosso único ponto. Estava 3 a 3. Todos ficariam gratos a mim. Seria promovido a titular. Mas no ultimo segundo o Zezinho chutou forte de longe. Gol. Fora do alcance do Ary, que atacava com um par de havaianas dentro de suas luvas de lã. Ganhamos por 4 a 3. Todos brigaram com o Ary. Eles viram que o Ary tinha me deixado fazer aquele gol. Ary foi humilhado como nunca antes em toda sua carreira. E no meu time? Todos só queriam saber do Zezinho. No final do jogo fui lá falar com o Ary, que me recebeu assim: _ Sai fora, meu. Tu tinhas que me driblar? Eu não ia defender. E saiu, com olhos marejados, pra nunca mais falar comigo. Arrependo-me de tê-lo traído daquele jeito. Foi como ter lhe furado os olhos. Uma amizade como aquela vale muito mais que uma simples vitória. De pouco adianta meu arrependimento, depois do que fiz. Por que não pensei antes? Por quê?
Elder Nunes Junior

Texto publicado no Cenário de Notícias dia 25/03/2008.

terça-feira, 18 de março de 2008

CENTROAVANTES TAMBÉM CHORAM

Falar em quem tem talento é sempre uma honra. Por isso me prontifiquei para entrevista-lo. O Flávio, eu o conheço dês de a infância, quando jogávamos juntos nos campos de linhas imaginárias e goleiras de havaianas em ruelas e pátios vazios do Ipiranga na beira do rio Uruguai.Ele era o melhor centroavante dos campinhos do Ipiranga. Pegava em qualquer time de Pirinópoles do Sul.Ele é com as mulheres como é no futebol. Não dribla zagueiros nem namoradas. Quando está difícil de passar pela zaga, chuta de fora da área mesmo, mas costuma ter certa paciência pra esperar a hora de estufar as redes. Volta e meia faz um gol de placa; geralmente é simples, objetivo: domina, vira, bate... gol e é só correr pro abraço. E é aí que ele faz a diferença. Um artilheiro.Uma máquina de inspiração, palavras certas em momentos oportunos. Uma fábrica de gols, mas, principalmente, de reflexão e sorrisos alheios. Parceiro de tantas baladas, boemia e festas inenarráveis, que o tempo e a distância nos subtraiu.A entrevista era sobre ele ser o goleador do estadual. Fui até o vestiário, num dia de treino, mas com tantos assuntos para por em dia a entrevista propriamente dita não começava. E quando eu estava prestes a dar início ele abre seu armário e o que eu vejo...Uma foto!!!Depois disso não teria como começar a entrevista. Não era qualquer foto! Percebi em seus olhos que ele também queria conversar sobre ela, sobre ele, sobre eles.Um amor antigo. Alice fora sua namorada na adolecência, quando ainda jogava em juniores. Era uma bela morena, sim, mas via-se que engordaria ao passar dos anos. Não pensem que tenho algo contra as gordinhas. Me orgulho de cada uma que já fiz feliz. Passados meia dúzia de anos e ele ainda com foto dela no armário... estranho.Decidi que faria a entrevista mais tarde ou até outro dia e o convidei pra ir a um bar e tomar uns chopes com churrasquinho de gato, enquanto conversávamos sobre o assunto. A entrevista que espere.A julgar pelas mulheres que o procuravam depois dos jogos e gritavam: lindo, tesão, bonito e gostosão!” e sua fama de mulherengo, ele devia ser um baita comedor. Não teria o porquê cultivar esse amor pela Alice. Foi mais ou menos o que eu disse. E perguntei, ainda: quantas mulheres tu já comeu?E mais ou menos assim veio a resposta:"_Nunca contei mulheres! Comedor, eu? Não! Eu faço amor... – continuou, professoral – o sexo delas eu tenho, mas assim... casual. De fome é que eu não morro. Sobre ser mulherengo... aí é que está: elas pensam que sou canalha, o que torna-se uma decepção. Porque mulher comigo não paga, lhe dou atenção, sexo, carinho, amor, mando flores e alugo um filmezinho. E a Alice. Aquela mulher me atormenta. Ela está sempre nos meus jogos, passa o jogo me olhando, mas aos 45 do segundo ela some sem que eu consiga mais vê-la. Tenho sonhado com ela, isso quando não me tira o sono".Como pude julgá-lo tão mal? Como se um centroavante não amasse, não chorasse...Percebi que com as outras ele era feliz, mas é ela que o faz sofrer.
Elder Nunes Corrêa Junior

Texto publicado no Cenário de Notícias em 18/03/2008

sábado, 15 de março de 2008

AMANDA

Como faço pra escrever um poema sem usar seu nome?
Como falar nas belezas da vida sem você?
Falar nas flores sem sentir seu perfume
Falar em cores sem ver seus olhos
Falar de doces sem desejar sua boca
Falar nas estrelas sem mais enxergar a que lhe dei
Falar no passado sem ter passado contigo
Falar de tristeza sem lembrar seu choro em meu ombro
Falar em mulher... Falar de amor... Sem pensar em você AMANDA

Elder Nunes Corrêa Junior

Esses Egos

Por esses dias até nem sei, mas esses tempos conferi uma discussão ferrenha na internet. “Pessoal de São Gabriel”, o nome da comunidade do Orkut, onde passava as discórdias as quais me refiro.Quando fui olhar mais atentamente os motivos da tal discussão (que a priori era uma enquete sobre qual seria o melhor jornal da cidade) percebi que, não bastasse os moderadores excluírem os comentários de seus colegas de imprensa, posteriormente excluíram, também, a dita enquete com suas postagens, impondo, assim, um ponto final no assunto.Tudo bem, já que o assunto estava se desvirtuando, mas que eles - que eram os principais alvos e os que mais se contradiziam e depois se justificavam - apenas se reservassem em simplesmente não postar mais.Um moderador levou uma “surra”. Tudo o que ele dizia se voltava contra ele e os demais participantes aproveitavam pra chicotear um pouco mais.Não foi por vergonha ou por medo ou porque seu jornal não estava na frente da enquete, foi pelo EGO que retiraram a enquete da comunidade. Ego, e só.O ego do cara ficou ferido. Não tenho nada contra a dita pessoa, até me dou com ele, mas realmente, é muito ego pra pouca prosa.Foi por culpa desse tal de ego que o Inter perdeu os dois últimos gauchões. É por ego que alguns jogadores inventam jogadinhas como o chute falso do Valdívia ou o da foca, do Kerlon, e o que alguns mudam toda hora de cabelo ou buscam o gol mil (e não é o da wolksvagem). Contando fogueirão, pelada de rua, três-dentro-três-fora, super chance, joguinhos de final de semana e no pátio de casa com certeza eu já tenho muito mais de mil gols. Dez, vinte mil. Sei lá.É por esse mesmo ego que o Brasil inteiro está nesse chororô.é por isso também que jogadores como Roger e Rada casam com atrizes, ou vão pra Europa e voltam só no carnaval pra desfilar na Sapucaí.É o ego que não deixa alguns jogadores enriquecerem e virarem craques.Ego. Ego. Ego... O mal ou o bem do mundo?Admito, é, também, pelo ego que eu sou centroavante e uso a camisa 9.

Elder Nunes Corrêa Junior

Texto Publicado em 15/03/2008 no Cenário de Notícias.

quarta-feira, 12 de março de 2008

A RELATIVIDADE DA FELICIDADE

Se uma pessoa sofre nesse vale de lágrimas, essa pessoa é a Débora. A coitada é gorda. Bota gorda nisso.Tão gorda que ela não passa na roleta do ônibus. Cada vez que embarca é um constrangimento, mas fazer o que, se caminhar muito é impraticável?A Débora mede mais ou menos um e setenta e pesa... sei lá! Nunca peguei ela no colo pra saber. Tampouco conseguiria (lembro que uma vez fui carregar uma garota de uns setenta quilos por uns cem metros e sofri). Chutando assim por baixo ela deve pesar meia vaca.A Débora chega a ser quadrada de tão redonda. É uma baita mulher, acho que a maior que já vi. Pra se ter uma idéia do tamanho imagina duas gordas, dessas gordas clássicas, uma de costas pra outra. Essas duas gordas de lado. Assim é a Débora de frente.As gordas geralmente são mais felizes, mais alegres, mais amigas e mais amantes que as magras. Uma mulher gorda sempre tem mais amigos e amigas verdadeiros. São as gordas que vão pra praia e se divertem. Enquanto as magrinhas e as falsas magras andam cuidando pra não aparecer as celulites e as estrias e as gorduras localizadas e tomam aguinhas e comem sanduichezinhos naturais(quando não estão de regime), as gordinhas caminham com o balancê das gorduras e vão pro mar e riem bastante e quando voltam pra descansar sentam nos quiosques e pedem aquela cervejinha bem gelada e uma, duas, três porções de batatinhas ou bolinho de peixe bem engordurados e com bastante maionese e se deliciam olhando pro mar.Mas quem não conhece a Débora jamais irá dizer que ela é feliz. Apesar de seu bom humor. As pessoas acham que uma gorda como a Débora não pode provar da felicidade. Não com as limitações que o peso lhe impõe e com o constrangimento de cada dia no ônibus, e em festas, e nos vestidinho nas lojas ou nas cadeiras que insistem em quebrar ou entalar. Estão enganados.Eu que conheço a Débora dês de que ela alcançou o terceiro dígito na balança, com seus 13 anos, afirmo: se tem uma pessoa que é feliz, é a Débora. E digo mais: ela é feliz com coisas simples. É de causar inveja.Ela é cozinheira duma lancheria. O Xis du Vido. Vido é o dono da lancheria, mas eu duvido que ele fique tão feliz quanto ela ao ver no olhar dos clientes a satisfação de saborear aqueles xis que ela faz com aquele ovo, aquela maionese, aqueles bifes e aquelas batatinhas...Pra Débora a melhor coisa do mundo é comer. Ela viveria sem amores, sem dinheiro, sem baladas, sem seu cachorro, sem amigos, sem nada alem de comida à vontade. E mesmo assim seria feliz. O prazer da vida dela é comer.A Débora é a prova de que não se precisa de tanto pra ser feliz. Não precisa seu time ter títulos nacionais, nem disputar uma libertadores, não precisa sequer ter títulos estaduais. Não precisa estar na primeira divisão, basta estar bem na hora. A felicidade de cada torcedor é relativa.Um dos torcedores mais felizes do Brasil em 2008 vai ser o corinthiano, que verá seu time retornar à elite. Ou foram os colorados que viram o Inter vencer a Inter. Mas feliz mesmo são os torcedores de times pequenos que jogam a Copa do Brasil e lotam seus estádios pra ver seu time, geralmente, perder pros grandes clubes de seus grandes ídolos. Mesmo perdendo eles ficam felizes, pois não decepcionam e não são eles quem tem a obrigação de ganhar. Mas quando vencem... É prato cheio
Elder Nunes Corrêa Junior

Texto publicado no Cenário de Notícias em 8/março/2008

As duas Palmeiras

Na frente da sorveteria que eu trabalho há duas palmeiras. Uma rente ao muro, num canto. Outra mais ao centro do terreno, onde as pessoas passam por ambos os lados. Quando fomos plantar as palmeiras, minha irmã advertiu que não podia plantar palmeiras em pares. Superstição ou estudos à parte plantamos um par delas.Como sempre, o encarregado de regá-las era eu. Raramente o fazia. Se quisessem água esperassem por chuva, ora. Numa selva elas não vão ter água trazida num balde. Elas também têm que aprenderem a se virarem sozinhas. E nem deve ser tão difícil, nem flor elas fazem.Depois que eu comprei meu relógio, passei a marcar o horário de tudo. Cinco pra hora o ônibus passa em direção ao centro, hora e cinco do centro à BR. Três e meia passa um vendedor de quindim, eu sempre quis comer quindim, um dia chamei o vendedor, comprei. Foi o primeiro e ultimo quindim que provei. Trinta minutos depois passa uma senhora que vende suco na frente do mercado. Vinte pras seis começa a cruzar as estudantes de volta pra casa. Mas é por causa de uma loirinha que eu fico todos os dias na frente da sorveteria esse horário. É uma loirinha que não sei o nome nem onde mora nem onde estuda ou trabalha, mas ela passa num ônibus e me abana. Eu abano de volta.Ás seis horas aumenta o movimento de mulheres enfiadas em suas calças “knor” fazendo caminhada. E tem uma moreninha que não sei como ela consegue respirar naqueles shortinhos dela. Segundas, quartas e sextas-feiras são os dias da caminhada dela. Qualquer dia desses vou me encher de coragem e vou interromper sua caminhada, lhe tirar os fones de ouvido de seus ouvidos e... e ai na hora eu invento.Sete e meia, da tarde, é claro. É o horário que eu queria chegar. Todos os dias (fora domingo) às sete e meia, Elias saia da sorveteria e ao passar pela palmeira do centro passava-lhe a mão direita. Acho até que lhe falava alguma coisa. Sempre quis saber o que ele falava. Essa palmeira sempre foi mais desenvolvida que a do canto, esquecida, excluída, solitária. Acho que a palmeira do centro crescia era com o carinho despendido por Elias. Mas sempre fiquei na dúvida que de repente a outra não crescia por estarem dispostas em par, como alertava minha irmã.Algo me dizia que a primeira opção era a mais coerente. Alias não qualquer coisa. O que me dava sinal disso era a própria palmeira.Elias adoeceu e não pode mais ir trabalhar. Com a saúde cada vez mais debilitada ele teve de ir a Porto Alegre se submeter a alguns exames e provavelmente a alguma cirurgia.Sem a mão e as palavras de Elias, a palmeira parou de crescer, de criar novas folhas e foi murchando e as folhas que tinha foram secando.O que mostra que além do carinho de Elias, ela precisava da repetição deles para crescer. Precisava de sua mão diária e pontualmente às sete e meia. Assim é um time de futebol. Idêntico. Mais que planejamento, um clube necessita de continuidade, de repetição. Dificilmente um time que vive trocando de técnico e de escalação consegue se manter no topo por muito tempo, isso quando chega ao topo.


Elder Nunes Corrêa Junior

Texto Publicado no Cenário de Notícias em 4/março/2008

domingo, 2 de março de 2008

JOGADOR PROFISSIONAL – Parte 2

Recapitulando o conto anterior: Um zagueiro perna-de-pau, porém muito forte e furioso descobriu que eu falava mal dele. Pior: seus colegas inventavam muito mais. Ele estava pronto pra me encurralar e me trucidar, mas eu consegui entrevista-lo sem sobressaltos.

No final da entrevista ele perguntou:
_Já está em “off”?
E eu voltando a tremer respondi que sim.
Ele começou: “Cara, tu é um jornaleirinho de merda. Eu já te vi jogando, tu não joga nada. Nunca jogou. Lembro de ti num peneirão. Eu passei... tu não. Eu já joguei no Grêmio, no Juventude na Ulbra, agora estou aqui, mas minha carreira vai decolar. Teu sonho era ser jogador de futebol, que nem eu, neh? Eu sei que era teu sonho.Mas eu é que sou profissional. Pro-fis-si-o-nal. Entendeu?”
Escutei tudo aquilo quieto e aliviado, pois apesar de tudo isso, pelo menos, ele não me bateria.
Certamente ele passou noites pensando naquele discursinho. E até que tem certa razão. Eu queria mesmo ser jogador de futebol. Não consegui.
Nem todos conseguem. Vários desses buscam atividades alternativas ligadas ao futebol tipo: árbitros, bandeirinhas, roupeiros, maqueiros, gandulas, vendedores de churrasquinho e até cronistas esportivos.
Mas eu penso no futuro. O que será do Araújo no futuro, daqui a uns vinte anos?
Um ex-jogador, só. Burro como ele é, que sequer diferencia um gravador dum celular, não vai ter profissão, nem toda essa força e seus joelhos estarão detonados.
Ai seremos quarentões, ele um fracassado ex-jogador, eu um fracassado futuro-jogador, porém ainda serei jornalista. Meus joelhos estarão em perfeito funcionamento e com garantia de mais dez mil quilômetros e meu jornal fará um jogo beneficente onde vai jogar Alexandre Pato, Gabriel Pensador, Rogério Flausino, o Presidente da República, o filho do Chico Buarque, Túlio Maravilha Junior, Ronald e mais uns amigos meus como o Rudiere, Juliano, Diogo, Lucas, Nelson e o Araújo. Sim, porque eu vou convidar o Araújo.
Eu com a 9 ao lado do Pato e do Ronald vou entortar tanto o Araújo que ele vai pedir pra sair. E nesse momento ele vai lembrar tudo que me fez ouvir a duas décadas. E quando ele se lembrar disso e me ver fazendo gols e depois contando sobre o jogo e perceber que ele não tem profissão, vai se arrepender de ter matado aula pra ficar jogando futebol no pátio do colégio invés de ler um livro.
Texto Publicado no Cenário de Notícias em 1°/03/2008.